O Diaconato Feminino na Igreja Católica
No dia 12 de maio de 2016 o Papa Francisco afirmou
que pode promover um estudo sobre o diaconato feminino na Igreja primitiva. Mencionou o tema
durante a audiência com a União Internacional de Superioras Gerais (UISG) no
Vaticano. O tema não é novo e foi proposto uma vez mais em tempos recentes.
João Paulo II respondeu em 1994 à abertura
anglicana com a carta “Ordinatio sacerdotalis” e negou categoricamente a
possibilidade do sacerdócio feminino na Igreja Católica. E este documento deve
ser entendido como uma definição “ex-cathedra”, isto é, infalível, como o
exprimiu a Congregação para a doutrina da fé, no mesmo ano de 1994. O Cardeal
Carlo Maria Martini foi quem falou da possibilidade de estudar a instrução do diaconato
para as mulheres, que não menciona no documento papal.
O então Arcebispo de Milão disse: “Na história da
Igreja existiram as diaconisas, por isso podemos pensar nesta possibilidade”.
Alguns historiadores da Igreja antiga sublinharam que as mulheres eram
admitidas em um especial serviço diaconal da caridade que se diferencia do
diaconato atual, entendido como o primeiro grau do sacerdócio.
No encontro com o Papa foram trocadas perguntas e
respostas, perguntaram ao Papa por que a Igreja exclui as mulheres para servir
como diáconos. As religiosas explicaram ao Pontífice que as mulheres serviam
como diaconisas na Igreja primitiva e lhe perguntaram: “Por que não
constituímos uma comissão oficial que possa estudar a questão?”. O Pontífice
respondeu que já havia falado alguma vez há alguns anos acerca deste tema “com
um professor bom e sábio”, que tinha estudado o papel das diaconisas nos
primeiros séculos da Igreja. Francisco havia explicado que ainda não estava
claro o papel que tiveram tais diaconisas. “O que eram estes diaconatos
femininos?”, recordou o Papa ter perguntado ao professor. “Havia ordenação ou
não?”. “Era um pouco obscuro”, disse. “Qual era o papel da diaconisa naquele
tempo?”; “Devemos constituir uma comissão oficial que possa estudar a questão?”,
perguntou o Papa em voz alta. “Acredito que sim. Seria pelo bem da Igreja
esclarecer este ponto. Estou de acordo. Falarei para que seja feito algo a
respeito”. “Aceito”, disse o Papa em seguida. “Seria útil ter uma comissão que
esclareça bem este assunto”.
Segundo uma tradição antiquíssima, o diaconato
estava relacionado “não ao sacerdócio, mas ao ministério”. Existem alguns
testemunhos da história sobre a presença das diaconisas, tanto na Igreja
ocidental como na oriental. Os testemunhos se referem também aos ritos
litúrgicos de ordenação. O ponto que deveria ser aprofundado é que tipo de
figura ministerial tinham, quais eram as funções que desenvolviam na
comunidade. A posição do magistério considera o diaconato como o terceiro grau
do sagramento da ordem e o reserva somente aos homens, assim como os dois graus
sucessivos, o presbiterado e o episcopado.
Ao estar de acordo em instituir uma comissão de
estudo sobre o diaconato feminino na Igreja primitiva, o Papa Francisco quer
verificar e ver como atualizar aquela forma de serviço, consciente de que as
diaconisas permanentes podem representar “uma possibilidade atual”. No começo
do cristianismo existia uma diaconia feminina (a qual menciona São Paulo) e foi
documentado que no século III, na Síria, existiam as diaconisas que ajudavam ao
sacerdote no batismo das
mulheres. Um papel que se recolhe nas Constituições apostólicas do século IV,
as quais se referem a um tipo de rito de consagração, entretanto este era
distinto da diaconia masculina.
Algumas formas de serviço de diaconia feminina
foram institucionalizadas há certo tempo, por exemplo na diocese de Pádua
(Itália) por iniciativa do então bispo Antonio Mattiazzo. Trata-se de mulheres
que, apesar de não vestir hábito religioso, emitiam votos de obediência,
pobreza e castidade. Elas se consagraram como “colaboradoras apostólicas
diocesanas”.
O papel e serviços desta nova forma de serviço se
explicaram em seu tempo na diocese: “É uma forma de diaconia feminina inspirada
no Evangelho. As colaboradoras apostólicas assumem a diaconia apostólica como
projeto de vida acolhido,
provado e orientado por parte do bispo”. Entre os serviços estão chamadas ao
anúncio da Palavra, a educação na fé, as obras de caridade ao serviço dos
pobres, a distribuição da comunhão, a animação da liturgia ou a gestão das
estruturas como escolas e institutos.
O Papa Francisco falou mais de uma vez a respeito
da necessidade para a Igreja Católica de valorizar o papel da mulher, mas
sempre evitou apresentar esta valorização como uma forma de “clericalizar” as
mulheres. “É algo que não sei de onde saiu – disse em dezembro de 2013, na
entrevista com ‘La Stampa’ devido a declarações sobre mulheres cardeais – as mulheres na Igreja devem
estar valorizadas, não ‘clericalizadas’. Quem pensa em mulheres cardeais sofre
um pouco de clericalismo”.
Em setembro de 2001, o então prefeito da
Congregação para a Doutrina da Fé, Joseph Ratizinger, junto com os cardeais Medina
Estévez, (Prefeito do Culto Divino) e Castrillón Hoyos (Prefeito para o Clero)
assinaram uma breve carta, aprovada pelo Papa João Paulo II, por meio da qual
afirmavam que “não é lícito pôr em ato iniciativas que em qualquer modo
pretendam preparar candidatas à ordem sacerdotal”. O texto se referia à ordem
diaconal como sacramento e primeiro grau do sacerdócio.
Novos estudos sobre o diaconato feminino na igreja
dos primeiros séculos, seu papel e deveres confrontados com o diaconato
masculino, poderiam abrir novas possibilidades e novas formas de serviço
consagrado além das ordens religiosas femininas já existentes.
“A Igreja necessita que as mulheres entrem no
processo de tomada de decisões. Também que possam guiar um departamento no
Vaticano”, afirmou o Papa Francisco respondendo seis perguntas que lhe fizeram
durante o encontro com 900 religiosas do mundo inteiro.
Na Sala Nervi, explicou que “a Igreja deve incluir
as consagradas e leigas na consulta, mas também nas decisões, porque
necessitamos seu ponto de vista. E este papel crescente das mulheres na Igreja
não é feminismo, mas corresponsabilidade e um direito de todos os batizados:
homens e mulheres”.
São Paulo e antigos
documentos da Igreja referem-se a diaconisas. Eram mulheres de conduta
irrepreensível chamadas a participar dos serviços que a Igreja prestava a
pessoas do sexo feminino, principalmente por ocasião do Batismo (ministrado por
imersão). Recebiam o seu ministério pela imposição das mãos do Bispo, que não
conferia caráter sacramental. – Com a rarefação do Batismo de adultos, foi-se
extinguindo a figura da diaconisa na Igreja a partir do século VI.
Fundamentação bíblica
É São Paulo quem se refere às diaconisas em três
passagens:
1) Rm 16, 1: O Apóstolo está em Corinto, onde escreve uma carta
que a diaconisa Febe da vizinha cidade de Cencréia deverá levar a Roma.
Recomenda-a nestes termos: “Recomendo-vos
Febe, nossa irmã, diaconisa da igreja de Cencréia, para que a recebais no
Senhor de modo digno, como convém a santos e lhe assistais em tudo de que
precisar, porque também ela ajudou a muitos, a mim inclusive”. O Apóstolo
não fornece indicação alguma sobre o ministério diaconal de Febe.
2) 1Tm 3,11: “Também as mulheres devem ser respeitáveis, não
maledicentes, sóbrias, fiéis em todas as coisas”. O contexto mostra que São
Paulo não fala das mulheres em geral mas da categoria das diaconisas, que vêm a
propósito na exortação dirigida aos diáconos Há quem prefira dizer que se trata
aí das esposas dos diáconos – o que parece pouco provável, pois em tal caso o
Apóstolo teria escrito: “As suas esposas…”
3) 1Tm 5, 9-11: “Uma mulher só será
inscrita na categoria das viúvas com não menos de sessenta anos, se tiver sido
esposa de um só marido, se tiver em seu favor o testemunho de suas boas obras,
criado os filhos, sido hospitaleira, lavado os pés dos santos, socorrido os
atribulados, aplicada a toda obra boa. Rejeita as viúvas mais jovens; quando os
seus desejos se afastam do Cristo, querem casar-se, tornando-se censuráveis por
terem rompido o seu primeiro compromisso”.
Pergunta-se se tais viúvas eram diaconisas. A
resposta mais provável distingue-as; ao lado das diaconisas (para as quais não
havia limite de idade), estariam viúvas de boa conduta auxiliando a Igreja em
funções diversas. Na tradição encontram-se as duas interpretações: ora viúvas e
diaconisas são identificadas entre si, ora distintas umas das outras, sendo
mais frequente esta última sentença.
Lê-se nas Constituições Apostólicas VI 17,
obra datada do século IV: “Seja assumida como diaconisa uma virgem pura ou ao
menos uma viúva fiel honrada, que se tenha casado uma só vez”. Ao passo que a
diaconisa é instituída pela imposição das mãos, tal gesto não se aplica às
viúvas; cf. ibid. VIII 24.
O apócrifo Testamento de Nosso Senhor Jesus
Cristo também distingue as diaconisas das viúvas: estas recebem a bênção d
Bispo e as incumbências de louvar a Deus nos sábados e domingos, nas festas da
Epifania, da Páscoa e Pentecostes, instruir as catecúmenas, visitar as
enfermas, ungir as mulheres por ocasião do seu Batismo. – Para as diaconisas,
resta como principal função levar a S. Eucaristia aos enfermos.
Tradição Apostólica
O mais antigo testemunho é o de Plínio o Jovem,
governador da Bitínia (Ásia Menor), que, tendo recebido a ordem de prender os
cristãos em 112 escrevia ao imperador Trajano ter submetido à tortura duas
cristãs honradas com o título de ministras (ministrae).
Cinquenta anos mais tarde terá escrito o Papa
Sotero (166-175) aos Bispos da Itália escreve: “Foi comunicado a esta Sé
Apostólica que algumas mulheres consagradas a Deus e religiosas tomam a
liberdade, nas vossas regiões, de tocar nos vasos sagrados e nas santas palas e
de incensar o altar ao redor. Tal prática abusiva e digna de censura merece a
rejeição de todo homem sábio. Consequentemente, no exercício da autoridade
desta Santa Sé ordenamos que essas coisas sejam radicalmente supressas dentro
de um prazo mínimo e, a fim de que não se repitam, mandamos que quanto antes
sejam banidas das vossas províncias” (citado pelo pseudo-Isidoro, Coletânea de
leis do século IV).
O diaconato feminino era Sacramento?
Para responder a tal pergunta, examinaremos a prece
de investidura de uma diaconisa conforme as Constituições Apostólicas
VIII 19s: “Bispo, tu lhe imporás as mãos
com a assistência do presbítero, dos diáconos e das diaconisas e dirás: Deus
eterno, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, Criador do homem e da mulher, Vós que
enchestes com vosso espírito Maria, Débora, Ana e Holda, Vós que não quisestes
deixar de fazer que o vosso Filho único nascesse de uma mulher, Vós que no
tabernáculo da Aliança e no templo estabelecestes mulheres como guardiãs
de vossas santas portas, lançai agora um olhar sobre vossa serva que aqui está,
destinada ao diaconato. Dai-lhe o Espírito Santo, purificai-a de toda mancha
corporal e espiritual, a fim de que exerça dignamente o ofício que lhe será
confiado, para a glória vossa e o louvor do vosso Cristo com o qual e com o
Espírito Santo Vos seja dada toda honra e adoração, santamente pelos séculos
sem fim”.
Neste texto é importante a referência à
imposição das mãos. Esta vem a ser um gesto polivalente, podendo significar
transmissão de graça, de faculdades, de saúde, de bênção… ou a investidura de
uma diaconisa; não tem valor sacramental neste caso, pois nunca na Liturgia e
no Direito antigos a diaconisa foi equiparada ao diácono; a contrário sempre
lhe foram vedadas as funções do diácono e do presbítero, apesar das investidas
para exercê-las.
Observa S. Epifânio (+ 403):
“Se no Novo Testamento as mulheres fossem chamadas
a exercer o sacerdócio ou algum outro ministério canônico, a Maria deveria ter
sido confiado, em primeiro lugar, o ministério sacerdotal; Deus, porém, dispôs
as coisas diversamente; não lhe conferiu nem mesmo a faculdade de batizar.
Quanto à categoria das diaconisas, existente na Igreja, não foi destinada a
cumprir funções sacerdotais ou outras similares. As diaconisas são chamadas a
salvaguardar a decência que se impõem no tocante ao sexo feminino, seja
cooperando na administração do sacramento do Batismo, seja examinando as
mulheres afetadas por alguma enfermidade ou vítimas de violência, seja
intervindo todas as vezes que se trate de descobrir o corpo de outras mulheres
a fim de que o desnudamento não seja exposto aos olhares dos homens que
executam as santas cerimônias, mas seja considerado unicamente pelo olhar das
diaconisas” (Panarion LXXIX 3).
Como se vê, S. Epifânio, representando a
tradição, vê nas diaconisas auxiliares no trato pastoral das mulheres. Tal
ministério fica portanto claramente distinto do ministério dos diáconos.
Ademais é de notar: o próprio São Paulo estima e
recomenda a diaconisa Febe (Rm 16, 1), mas não queria que a mulher falasse em
público na igreja (o que é incompatível com o diaconato propriamente dito). Ver
1Cor 14, 34s: “Como acontece em todas as assembleias
dos Santos estejam caladas as mulheres na Igreja, pois não lhes é permitido
tomar a palavra. Devem ficar submissas como diz também a Lei. Se desejam
instruir-se sobre algum ponto, interroguem os maridos em casa; não é conveniente
que uma mulher fale nas assembleias”. São Paulo escreve isso num contexto
matriarcal como Corinto, que tinha como padroeira a cidade a deusa grega
Afrodite. São Paulo vai de encontro a cultura em que é o Pastor.
Em 1Tm 2, 11s volta a advertência: “Durante a instrução a mulher conserve o
silêncio com toda submissão. Não permito que a mulher ensine ou domine o homem”.
Quem escreveu tais sentenças, não teria tolerado ver uma diaconisa pregar o
Evangelho. Não há dúvida, as restrições feitas pelo Apóstolo às mulheres são a
expressão de uma cultura já ultrapassada; hoje em dia não têm mais vigência;
como quer que seja, contribuem para corroborar a interpretação que vê, antes do
mais, nas diaconisas colaboradoras no serviço pastoral às mulheres.
Nem por isto a mulher é menos apreciada do que o
homem por parte da Igreja. Tenham-se em vista as palavras do Papa João Paulo II
em sua Carta Apostólica sobre a Dignidade da Mulher nº 26s:
“É de notar que Cristo só chamou homens para serem
seus Apóstolos. Fazendo isto, o Senhor agiu de maneira livre e soberana; não se
creia que Jesus, assim procedendo tenha apenas procurado conformar-se à
mentalidade discriminatória dominante em sua época; Ele não fazia acepção de
pessoas (cf. Mt 22, 16). Em consequência somente os doze Apóstolos receberam o
mandato: “Fazei isto em memória de mim” (Lc 22, 19; 1Cor 11, 24). Somente eles
na tarde da Ressurreição receberam o Espírito Santo para perdoar os pecados
(cf. Jô 20, 22s). Daí se pode deduzir que o sacramento da Ordem, que perpetua a
ação redentora de Cristo mediante seus ministros, é destinado aos homens
apenas, como aliás já observou a Congregação para a Doutrina da Fé na
Declaração Inter Insigniores de 15/10/76.
Em contra posição há uma posição revolucionária
de Jesus em relação as mulheres de sua época. Ninguém, com sua
vida e ensinamentos, impactou tanto a história de uma maneira tão intensa
quanto Jesus. O que Ele ensinou e o que fez alterou o curso da história e
dramaticamente mudou e continua mudando milhões de vidas ao redor do mundo.
Seus ensinamentos têm afetado cada aspecto da vida – religião, educação,
trabalho, ética, saúde, justiça social, desenvolvimento econômico e as muitas
artes e ciências do viver humano.
Uma faceta da missão de Jesus que é menos
conhecida, mas digna de ser recapitulada, é Sua atitude para com as mulheres.
Isto é particularmente importante à luz de como o mundo na época de Jesus
tratava as mulheres. Romanos e gregos, judeus e gentios, davam às mulheres nada
mais que a segunda classe, como se elas fossem prestativas ferramentas em uma
sociedade de domínio machista – cozinhar, dar à luz e criar as crianças e
desempenhar qualquer função que lhes estivesse designada dentro das paredes de
sua casa. Casos individuais de liderança e valentia se destacam em vários
lugares, mas muitas mulheres estavam sob o domínio dos homens. Elas eram
consideradas uma propriedade, transferida de pai para marido.
Em um mundo como aquele, Jesus veio e
abriu novas perspectivas de igualdade e dignidade humanas. Ele se opôs às
tradições e procurou direcionar os homens e as mulheres de volta ao plano
original de Deus para a humanidade.
As sinagogas do primeiro século mantêm
registros somente de homens. Homens e meninos podiam entrar nas sinagogas para
adorar, mas para as mulheres e meninas havia uma divisória separada onde era
permitido que elas se sentassem.
A tradição Judaica afirmava que as
mulheres não tinham direito à salvação por seus próprios méritos. A única
esperança de salvação era se unir a um devoto homem judeu. As prostitutas eram
excluídas porque não tinham esse vínculo, e viúvas precisavam ter sido casadas
com um judeu piedoso para ter esse privilégio.
Na sociedade Judaica, um homem era
proibido de falar com uma mulher em lugares públicos. Um rabino deveria ignorar
uma mulher em público, mesmo se ela pacientemente persistisse em busca de algum
urgente conselho espiritual. Em um enterro, as mulheres caminhavam à frente do
caixão. Elas eram consideradas responsáveis pelo pecado e, por isso,
encabeçavam a procissão, levando a culpa pelo que havia acontecido. Os homens,
não se sentindo responsáveis, caminhavam atrás do corpo.
As mulheres eram consideradas cerimonial e
socialmente impuras durante seu período menstrual. Durante sua menstruação,
elas eram isoladas. Até mesmo aos membros da família não era permitido chegar
perto para não serem contaminados. Aos olhos da sociedade, o valor de uma
mulher estava vinculado a sua habilidade de dar à luz. A esterilidade era um
estigma social terrível. A responsabilidade da mulher era dar à luz bebês do
sexo masculino que perpetuariam, desta maneira, o nome do pai.
Era privilégio do homem iniciar um
processo de divórcio, o qual ele podia exercer baseado em considerações que
hoje parecem frívolas e dignas de riso. A palavra de uma mulher, num tribunal,
precisava ser confirmada pelo menos por três homens, de outro modo, não tinha
valor. Não era permitido à mulher entrar em uma sinagoga para estudar; era
considerado perda de tempo. Não era permitido que as mulheres se aproximassem
do Lugar Sagrado no templo. Na época de Jesus, havia um pátio no templo para as
mulheres, localizado fora dos recintos reservados para sacerdotes e outros
homens, e uns 15 degraus abaixo, que indicava a posição subordinada da mulher.
É
emblemático a oração de um Judeu: “Eu te louvo e agradeço Senhor Deus de
Israel, por não ter nascido mulher...” Como se vê, a sociedade de Jesus é
preconceituosa, machista e patriarcal, não dando nenhum espaço às mulheres
(Joachim Jeremias. Jerusalén en Tiempos de Jesús: Estudio Económico y
Social del Mundo del Nuevo Testamento. Madrid: Cristiandad, 1977. p. 97s).
Jesus não começou uma revolução aberta
contra o sistema que colocava as mulheres em uma posição subordinada. Todavia,
Sua vida fez um manifesto. “Não
encontramos em nenhuma de suas ações, seus sermões ou suas parábolas nenhuma
depreciação referente às mulheres, tais como podemos facilmente encontrar em
qualquer de seus contemporâneos.” (Marga Muñiz. Femenino Plural: Lãs Mujeres en la Exégesis Bíblica. Barcelona: Clie, 2000. p.183).
Considere alguns exemplos de como Jesus
relacionou-Se com as mulheres. Jesus convidou as mulheres para serem Suas
discípulas. Contrariando as expectativas contemporâneas, Jesus deu as
boas-vindas às mulheres em seu círculo íntimo de discipulado (Lc 8, 1-3). Esta
atitude contradisse as especulações rabínicas. As mulheres que seguiram a
Cristo desprezaram os postulados da época. Elas se tornaram cuidadosas
administradoras de seus recursos e apoiaram a missão de Cristo em momentos
críticos (Lc 8,13). “Uma coisa era as mulheres serem desobrigadas de aprender o
Torah e proibidas de associar-se com um rabino, outra totalmente diferente era
viajarem com um rabino e se responsabilizarem pelos assuntos financeiros” Elas
fizeram isso, revolucionando os padrões da época (Alcion Westphal Wilson. “Los discípulos olvidados: La habilitación del amor
vs. el amor al poder”, en Bienvenida a la mesap. Langley Park, Maryland: TEAMPress,1998. p.185).
Jesus aceitou a hospitalidade das mulheres
e ensinou-as. O mais importante exemplo é aquele da associação com Maria, Marta
e Lázaro. O Mestre encontrou descanso e companheirismo na casa deles (Lc
10,38-42). Enquanto um rabino judeu quase não olhava para uma mulher, Jesus não
hesitou em falar com Maria e Marta em público ou em ensinar-lhes as grandes
verdades sobre a morte e ressurreição (Jo 11).
Para Jesus, mulheres e homens eram
igualmente importantes quando se tratava de ensinar sobre as boas-novas de Seu
reino. Na época em que foi dito “é melhor queimar as palavras do Torah que
confiá-las ao cuidado de uma mulher”, Jesus indicou que entre as escolhas
abertas às mulheres, Maria “escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada”
(Lc 10,42). Desta forma, mostrou que a educação não era para ser um monopólio
dos homens e que as mulheres também tinham o direito de aproveitarem as
oportunidades para se educarem.
Outro exemplo da atitude diferente de
Jesus para com as mulheres foi a revelação de Sua Missão a uma mulher. Na mais
longa conversa registrada nos Evangelhos, Jesus revelou à mulher no poço
samaritano (Jo 4,4-42) algumas das mais profundas doutrinas do reino: a
natureza do pecado, o significado da verdadeira adoração, a disponibilidade de
perdão para aqueles que se arrependem, a igualdade de todos os seres humanos
independentemente de serem judeus ou samaritanos. Assim, em uma simples
conversa no poço samaritano, Jesus rompeu dois preconceitos: de gênero e de
raça.
Jesus reconheceu que à vista de Deus a
família de Abraão inclui filhos e filhas. Ao curar a mulher incapacitada por 18
anos, Jesus colocou Suas mãos sobre ela e afetuosamente a definiu como “filha
de Abraão” (Lc 13,10-17). Por usar esta designação, Jesus advertiu em público
que as mulheres seguramente, tanto quanto os homens, herdam os direitos
prometidos a Abraão, e à vista de Deus não há nem homem nem mulher.
Em nenhuma parte da Bíblia está
estabelecido que os homens têm vantagem sobre as mulheres em termos de acesso à
salvação. Contrariamente às tradições rabínicas que ensinavam que as mulheres
poderiam ser salvas somente pela união com um devoto homem judeu, Jesus
convidou tanto homens quanto mulheres a se voltar para Deus e a aceitar o
presente da salvação.
Em outro caso, a defesa e o perdão de
Cristo a uma mulher surpreendida em adultério revelaram que Sua definição de
pecado e provisão para salvação estabelecia tratamento igual a todos. Quando
alguns líderes religiosos trouxeram perante Ele uma mulher surpreendida em
adultério, Cristo a defendeu. Ele sabia que os líderes judeus, ao fazer a
acusação contra a mulher, estavam, eles mesmos, violando as leis de Moisés.
A lei levítica estipulava que ambos, homem
e mulher, deviam ser submetidos a julgamento em tais casos (Lv 20,10), mas os
críticos de Jesus trouxeram apenas a mulher, e não os homens envolvidos no
suposto ato. A lei também requeria pelo menos duas testemunhas (Dt 19,15), mas
os fariseus não levaram nenhuma. A resposta de Cristo não somente deu à mulher
acusada o benefício da lei, mas também mostrou aos presentes que Seu evangelho
de perdão, baseado no arrependimento, estava aberto a todos. Assim Ele disse
esta notável frase: “Aquele que dentre vós estiver sem pecado seja o primeiro
que lhe atire pedra” (Jo 8,7). Em outras palavras, Jesus disse aos homens: se
vocês têm coragem de acusá-la, primeiro olhem para vocês mesmos em um espelho.
Jesus permitiu a uma mulher pecadora
ungi-Lo. Quando Jesus foi convidado para uma festa na casa de Simão em Betânia,
uma mulher conhecida no povoado por sua má reputação lançou-se aos pés de Jesus
e o ungiu. Aqueles que estavam reunidos na festa, incluindo Seus discípulos,
condenaram o incidente. Como era possível uma mulher pecadora tocar os pés do
Messias, ungi-Lo e secar Seus pés com seus cabelos? Uma ofensa absoluta às
tradições religiosas! Os que estavam ao redor de Jesus não podiam entender,
muito menos aceitar, o ato de uma mulher ou a atitude de Jesus em permitir que
ela fizesse o que fez. Mas Jesus disse que a mulher ao ungi-Lo fez uma bonita
ação, mostrando às gerações futuras que, como ela, todos os pecadores podem ter
a certeza da salvação ao ir até o Salvador e colocar sua vida a Seus pés, em
rendição (Mc 14,1-9; Lc 7,36-50).
Jesus usou homens e mulheres para
simbolizar os atos de resgate de Deus. Em Lc 15, Jesus contou três parábolas
para ilustrar a profunda e eterna verdade da procura de Deus pela humanidade perdida.
Ao passo que as parábolas da ovelha perdida e do filho pródigo ilustram a
procura de Deus através de figuras masculinas, do cuidado do pastor e o amante
pai, a parábola da moeda perdida revela a procura de Deus através da cuidadosa
e persistente missão de uma mulher que não sossegou até encontrar a moeda e
regozijar-se com seus amigos (Lc 15,8-10). Para os ouvidos legalistas daquela
época isto deve ter soado herético.
Jesus dignificou as mulheres como
primeiras testemunhas do maior evento da história humana – Sua ressurreição. As
tradições rabínicas consideravam as mulheres como mentirosas por natureza.
Conceito que advinha da reação de Sara ao ser dito que ela teria uma criança
(Gn 18,9-15). No modo de pensar deles, a negação e o riso de Sara caracterizavam-se
como uma mentira diante de Deus que sempre diz a verdade. Assim, por causa
dela, todas as mulheres descendentes eram consideradas mentirosas.
Nenhuma mulher era aceita como testemunha.
Todavia, Jesus rejeitou esta perversa tradição e escolheu mulheres como as
primeiras testemunhas de Sua ressurreição (Mt 28,8-10), “constituindo-as não
somente como as primeiras receptoras da mais importante mensagem do
cristianismo, mas as primeiras a proclamá-la”. Jesus reprovou os discípulos por
não crerem no testemunho daquelas mulheres (Mc 16,14) e desta maneira
incentivou-os a rejeitarem os preconceitos do passado e caminharem à luz de Seu
reino, no qual não há nem homem nem mulher.
No relato bíblico da vida de Cristo “as
mulheres nunca são discriminadas”. (Leonardo Boff. El
Rostro Materno de Dios: Ensayo Interdiciplinar sobre lo Femenino y sus Formas
Religiosas, Madri, Paulinas, 1988. p. 83. [Em português: O Rosto Materno de
Deus. 9ª ed. Rio de Janeiro, Vozes, 2003).
Não há nada que respalde a visão cultural
e religiosa da Sua época que via a mulher como inferior. Pelo contrário, “a
atitude e a mensagem de Jesus significaram uma ruptura com a dominante visão
mundial”.
Jesus “não identificou as mulheres em
harmonia com as normas do sistema patriarcal de seu tempo nem tomou parte no
sistema como era, por definição, repressivo para as mulheres”. Abertamente mas
sem fanfarra, Jesus proferiu um golpe mortal na praga da tradição que negava
dignidade às mulheres. Através de Seu exemplo e ensino, Jesus reclamou para Seu
novo reino as bênçãos de Sua criação original, a igualdade dos dois gêneros à
vista de Deus.
Diante desta atitude revolucionária de Jesus, nos vem a
pergunta: Por que Jesus não constitui Apostolas, mas só apostolos? Tal
indagação ainda não respondida, leva a Igreja a não sentir-se confortável em
ordenar mulheres.
Há possibilidade Jurídica para se
ordenar mulheres, no grau do diaconato? Quais as funções reservadas pelo
direito aos diáconos na atual legislação da Igreja? E, uma mulher pode
realiza-las?
No início da Igreja os apóstolos
criaram o diaconato para assistir os órfãos e as viúvas (At 6,1-10). Com o
passar do tempo foi incluso à missão dos diáconos à mesa (caridade), Palavra
(pregação/catequese) e o altar (ações litúrgicas).
Na atual legislação os diáconos
podem ser provisórios – destinados ao presbiterato – ou permanentes – homens já
casados, com 35 anos no mínimo, que com a autorização de suas esposas, podem
entrar no Estado Clerical.
Os diáconos, na liturgia dominical
lhes reserva a proclamação do Evangelho, auxiliar o sacerdote no altar,
convidar a assembleia para o ósculo da paz e a despedida da assembleia no final
da celebração eucarística.
Podem ser convidados a proferirem pregações
e/ou a homilia (cc. 764; 767 §1º), podem oficiar a celebração do batismo (c.861
§1º), são ministros ordinários da comunhão Eucarística (c. 910 §1º), podem
expor e realizar a bênção solene da Eucaristia (c. 943), podem oficiar o
matrimônio caso sejam delegados pelo Ordinário do Lugar e/ou o Pároco (c. 1108
§1º), celebrar exéquias eclesiásticas (c. 1168), celebrar bênçãos (c. 1169 §3º).
Podem governar uma paróquia em
determinadas circunstâncias (c. 517 §2º), devem rezar a liturgia das horas (c.
276 §2º), tem obrigações específicas (c. 288) e, caso tenham dedicação
exclusiva à Igreja devem receber honesta remuneração (c. 281 §3º).
Tais atribuições podem também ser
concedida as mulheres na Igreja: pregações (c. 776), oficiar o batismo (c. 861
§2º), ministros da comunhão eucarística (c. 910 §2º), oficiar extraordinariamente
o matrimônio, dentro dos limites expostos no cânon 1112, ser ministros das
exéquias eclesiásticas (c. 1168), celebrar algumas bênçãos conforme o atual
ritual de bênçãos. Podem também governar paróquias (c. 517 §2º).
Portanto, na atual legislação da
Igreja não há nada que impeça que uma mulher possa exercer todas as funções
permitidas a um diácono. Além do mais podem ser diaconisas permanentes
celibatárias ou casadas com a expressa autorização do marido, conforme a atual
disciplina da Igreja. Não há do ponto de vista doutrinal, bíblico, jurídico,
sociológico, filosófico nada que contradiga a constituição de mulheres ao
ministério ordenado de mulheres no grau do diaconato. Pode ser, antes do que
muita gente pensa que esse postulado seja consagrado pelo Papa Francisco.