José Everaldo Rodrigues Filho

Licenciado em Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará.

Bacharelado em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

Mestrado em Direito Canônico pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma.

Laureado em Direito Canônico pela Pontifícia Universidade Lateranense de Roma

Bacharel em Direito e Advogado OAB-AL 13960


sexta-feira, 6 de abril de 2012

O Presbítero e a Paróquia II

2. No Código de 1917: Acenos históricos ao Código de Direito Canônico de 1917

O cardeal Pietro Gasparri, que foi a mente e o coração do Código de direito Canônico de 1917, pois foi ele que coordenava a comissão codificadora na época; inseriu no CIC (Código) de 1917 a mentalidade eclesial da época, a saber, Igreja como uma estrutura hierárquica, com um governo centralizado nas decisões pontifícias. Na época a visão predominante era a de Igreja como uma sociedade perfeita. Portanto, o conceito de paróquia e de pároco gira em torno dessa hermenêutica[1].
É esta mentalidade eclesial que favorecia a visão de paróquia como um território determinado da diocese[2], que era dado a um pároco como uma posse feudal, concomitantemente ao direito de auferir rendas beneficiais. Para o CIC de 1917 a paróquia deveria ter alguns elementos fundamentais: 1) uma freguesia; 2) um pároco; 3) a cura de almas; 4) o território; 5) a Igreja própria; e 6) o dote beneficial:
“El tratamiento que el CIC 17 hace de la parroquia puede calificarse, sin duda, de disperso. El bloque mayor lo encontramos en el Libro II, Sección II: De los Clérigos en particular. Y otro núcleo importante se desplaza al Libro III, Parte V: De los beneficios. No hay, por tanto, un tratamiento sistemáticamente unitario; la visión que nos ofrece el CIC 17 gravita sobre tres puntos de referencia; el clérigo, el beneficio y el territorio”[3].
No código de 1917 era obrigatório a divisão das dioceses em paróquias[4] tal prescrição é uma conquista fundamental do Concílio de Trento que procurou resolver os problemas na época existentes[5]. Paralelo a esta prescrição conciliar que foi assumida com radicalidade, o código de 1917 prescrevia ao Bispo diocesano a determinação do dote das paróquias, que por seu decreto seriam erigidas, seja mediante bens ou dinheiro[6].
O capítulo sobre os dotes e benefícios paroquiais era a vértebra principal que orientava o estatuto universal das paróquias no CIC de 1917 e, dava a entender que a paróquia era um território adquirido vitaliciamente pelo pároco. A ideia de benefício estava definida no antigo cânon 1409*.
O benefício era o conjunto de bens – móveis e imóveis – que pertenciam a determinada entidade jurídica e geralmente era destinada para o usufruto de um beneficiado. Por exemplo: casas, terrenos, utensílios que auferiam lucros etc[7]. O benefício era tido como uma pessoa moral não colegial[8] e por isso era destinado à perpetuidade[9], urgia a ereção canônica por parte da autoridade eclesiástica competente[10], a fim de destiná-lo a um determinado ofício sagrado e conferir ao detentor do ofício o direito de auferir rendas do dote beneficial[11]. Porém, vendo-se que prudentemente não haveria de faltar o necessário, não era proibido ao Bispo diocesano constituir paróquias sem os respectivos dotes[12]. Diante da noção jurídica de benefício, concomitantemente nasceu a ideia de pároco inamovível e amovível, que em muitas circunstâncias gerou problemas e distúrbios.



[1] Cf. M. Useros Carretero, “La Parroquia, tema de la Eclesiologia y del Derecho Canónico”, in REDC 17 (1962) 191-222.
[2] Cf. c. 216 § 1. Apesar do § 4 do mesmo cânon possibilitar erigir paróquias, com indulto especial da Santa Sé, por diversidade de línguas, nacionalidade de fiéis, familiares ou pessoais.
[3] Cf. A. Marzoa, “El Concepto de Parrochia Y el Nombramiento de Parroco”, in Ius Canonicum 29 (1989) 451.
[4] Cf. c. 216*. Tal imposição jurídica, como já afirmamos, vem do Concílio de Trento, Sessão XXIV, c. 13, de 11 de novembro de 1563.
[5] O completo abandono de muitas comunidades cristãs por parte dos ministros sagrados, fez com que Trento não só prescrevesse o dever de residência, mas o dever de dividir o território diocesano em paróquias, a fim de que os cristãos fossem atendidos em suas necessidades pastorais (cf. Sabino Alonso, “Los Párrocos en el Concilio de Trento y en el Código de Derecho Canónico”, in REDC 2 (1947) 947-979).
[6] Cf. c. 1415 §§ 1 e 2*.
[7] Cf. V. Rovera, “Beneficium ecclesiasticum”, in Periodica 60 (1971) 214-218.
[8] Cf. c. 1409*.
[9] Cf. c. 102 § 1*.
[10] Episcopus sive Ordinarius loci. (cf. .X. Wernz – P. Vidal, Ius Canonicum, II, Romae 1928, 176).
[11] Cf. c. 1414 § 2*.
[12] Cf. c. 1415 § 3*. O termo latino “Dotus” era usado comumente no passado como “o conjunto de bens que a mulher levava da casa de seus genitores para o seu novo lar depois do matrimônio”, ou ainda, “o conjunto de bens que o noivo era obrigado a dar ao genitor da noiva para receber sua permissão para as núpcias”. Porém, na Igreja constituía o conjunto de bens móveis ou imóveis que possibilitaria ao pároco se manter em sua nova paróquia (cf. S. Alonso Morán, Los Beneficios Eclesiásticos”, in M. Cabreros de Anta - al, Comentarios al CDC [del 1917], III, Madrid 1964, 100s).